sábado, 28 de março de 2009

Agora o Presidente da CNE é Ministro



Carta ao amigo Macamo

Meu caro amigo, espero que as notícias vindas de Mogincual, de Tete e de outros cantos deste vasto Moçambique, especialmente onde há esquadras e cadeias, não te tenham deixado desesperado. Penso que tudo é o resultado de uma política lacunosa sobre a protecção da dignidade humana.

E falando de dignidade, parece que alguém poderoso afirmou que os falecidos em Mogincual teriam direito a um enterro condigo. Vê se pode? Viver sem dignidade, morrer sem dignidade e ser enterrado com dignidade. Não te parece que estamos a inventar novos conceitos de dignidade humana?

Mas não é sobre isso que te escrevo meu caro amigo. Te escrevo porque recentemente, recebi uma notícia que dava conta que o Presidente da Comissão Nacional de Eleições, passa a ter o estatuto de Ministro e os restantes membros da mesma Comissão, o estatuto de vice ministros.

Que notícia interessante não é meu amigo? Agora passamos a ter mais um ministro e mais alguns vice ministros, todos com as regalias e benesses que merecem, incluindo salários, viaturas, passaportes diplomáticos, isenções, ajudantes de campos e outros.

Se passamos a ter na prática mais um ministro e mais vice ministros, na prática também significa que já temos mais um ministério. A única diferença com os outros é que este, ao invés de ter um ou dois vice ministro, tem muitos mais.

Acho que é aqui onde reside minha dúvida meu caro amigo. Se calhar a minha dúvida fundamenta-se no meu desconhecimento em relação ao verdadeiro conteúdo do que seja um ministério e o que é uma Comissão Nacional de Eleições.

No inicio, pensei que um ministério é um sub órgão do Estado com determinada função numa área especifica de desenvolvimento, por exemplo, na agricultura. Assim, o ministro e os vice ministros, eram pessoas da confiança do presidente, indicados directamente por ele para levarem a cabo o seu programa de governo.

Nessa mesma linha do meu raciocínio inocente, pensei que uma Comissão Nacional de Eleições, principalmente a nossa que é composta maioritariamente por membros independentes e da sociedade civil, fosse um órgão distante do governo, uma instituição criada para responder pelos processos eleitorais, esses que legitimam os governantes que formam governos.

Esse era o meu pensamento meu caro amigo. E nessa senda, é difícil perceber aqui na minha cabeça dura, como é que o ministro e o presidente da comissão nacional de eleições podem ser colegas e até companheiros.

Mas como perguntar não é mau, fui ter com um jurista que entende da matéria e coloquei as minhas questões. A resposta que tive é que, o porta voz do governo disse, o estatuto do presidente da comissão nacional de eleições passa a equiparar-se a de um ministro e o dos restantes membros a de vice ministros. Não disse que passavam a ser ministro e vice ministros respectivamente.

Quando sai dessa consulta meu amigo, pensei que tinha entendido bem a explicação, mas quando cheguei a casa parecia que alguém formatou minha cabeça novamente, isso porque, a dúvida voltou e desta vez mais intensa. É que não consigo perceber como é que uma pessoa que se equipara a um ministro em todas as suas regalias e condições não pode ser chamado de ministro.

Formalmente não é ministro, mas na minha cabeça, eu que gosto de ser prático, ele é ministro. Mesmo respeitando a opinião do jurista que tudo fez para deixar-me cada vez mais esclarecido, acho que há gato nisso tudo.

Donde vem o gato meu irmão? O gato vem das eleições. É que essa “promoção” dos membros da Comissão Nacional de Eleições para membros do governo, acontece num ano de eleições muito fortes. Eleições presidenciais, eleições legislativas e eleições provinciais.

Essa promoção, acontece numa altura em que a Renamo está moribunda, mas na Beira surge um novo partido, que por ter o galo como seu símbolo, não se sabe o quanto pode cantar. E os que estão no poder, porque não são nada distraídos, e porque em alguns lugares o partidão mostrou-se tremido, é preciso organizar o estádio antes do jogo. E jantar com os árbitros é já um bom começo.

De todas as maneiras, para não parecer que eu sou invejoso e não gosto que outros tenham boas condições de vida, prefiro parar aqui e apelar que pelo menos permaneça a verticalidade no julgamento dos factos.

Para mim, nem que tenham o estatuto de Presidente da República, o mais importante é que mantenham o órgão independente e credível. Um órgão que pode afirmar de boca cheia que as eleições em Moçambique são realmente democráticas. Estamos a precisar de uma democracia mais inclusiva e participativa.

Agora, uma coisa é certa meu caro amigo, ser membro da CNE vai passar a ser muito difícil e vai começar um jogo de influencias para ser presidente dessa Comissão, afinal quem não quer ser ministro ou vice ministro?

Uma última pergunta mano: com essas regalias todas, será que os membros da CNE vão parar de exercer as outras funções que mantiveram depois de tomarem posse como tal ou serão ministros turbo?

1 comentário:

Nelson disse...

Interessante. Vou rouba-la ao "meu mundo"